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por Equipe do Observatório

Home office e produtividade: qual é o cenário atualmente

Após o Itaú demitir cerca de mil funcionários remotos supostamente por baixa produtividade, tendo como métrica o volume de cliques do mouse dentro do sistema do banco, a questão sobre os prós e contras do home office e como medir o rendimento dos funcionários voltou à tona. A medida do banco também gerou questionamentos sobre a legalidade e confiabilidade do processo pelo qual os empregados demitidos foram avaliados: afinal, é certeza que mais cliques significa que estavam trabalhando “mais” ou “melhor”?

O advogado trabalhista Matheus Scoponi lembra que a CLT prevê o teletrabalho ou trabalho remoto há muito tempo, mesmo que não fosse comum o ajuste nessa forma antes da pandemia de covid-19 em 2020. A reforma trabalhista, em 2017, deu um maior fôlego a essa modalidade e trouxe ampliação da regulamentação. Com a crise gerada pela pandemia, houve migração em massa para o modelo, que agora sofre pressão para encolher sob o argumento de que o empregador tem maior controle e ganho de produtividade presencialmente.

“A centralidade da questão é produtividade e a problemática é como se mede a produtividade, pois não há consenso sobre como se verificar o aumento de produtividade. Há medições a partir de aumento de faturamento e de impacto financeiro, mas que não abrangem setores que não são tipicamente produtivos, como por exemplo, o de recursos humanos”, pontua Scoponi. Portanto, essa avaliação fica a critério do empregador, mas nem todo trabalho é mensurável dessa forma, sendo muitas vezes qualitativo ou baseado em demandas.

“Não se trata aqui de ilegalidade, até por não ter se avançado a questões pessoais dos empregados, mas é, sim, falha na relação, o que pode levar à formação de ambiente de desconfiança”

Quanto ao modelo de supervisão e monitoramento digital dos funcionários, como o empregado pelo banco, o advogado informa que não há nada de ilegal na prática. “A princípio, não há nenhuma irregularidade nessa supervisão, ainda que se dê no ambiente doméstico. O que o empregador não pode é ter acesso a ambientes pessoais, de forma que esse controle deve se limitar às aplicações fornecidas para atividades de trabalho exclusivamente. No trabalho presencial isso também vale. Os computadores da empresa podem ser vigiados, mas o acesso a questões pessoais, como redes sociais e emails pessoais, são proibidos”, explica.

No caso do Itaú, porém, os empregados não sabiam que eram monitorados, que é um problema de transparência. “Não se trata aqui de ilegalidade, até por não ter se avançado a questões pessoais dos empregados, mas é, sim, falha na relação, o que pode levar à formação de ambiente de desconfiança, prejudicial ao trabalho, e que pode impactar negativamente os trabalhadores, até mesmo em termos de produtividade”, avalia o advogado.

Scoponi orienta que os limites entre pessoal e profissional devem ser muito claros e bem estabelecidos em todos os ambientes de trabalho, presenciais ou não. Sobre a métrica usada pelo banco, o advogado avalia que embora seja legal, ela traz alguns problemas: “o levantamento utiliza como premissa o tempo à disposição, ignorando ganhos objetivos em resultados, tanto que um profissional ouvido chegou a mencionar ter sido promovido recentemente por boas entregas. Nos parece ser um raciocínio antiquado de que o papel do trabalhador é estar continuamente à disposição, pouco importando o impacto positivo, especialmente o ganho financeiro criado ou seu impacto ao ambiente de forma geral”.

Se por um lado a empresa agiu dentro da legalidade e das prerrogativas do empregador, o mal-estar causado pode ser prejudicial: “a postura acende um alerta sobre como as empresas veem a produtividade e a figura do trabalhador como recurso ao resultado. Em tempos modernos, não parece ser bem aceito que estar continuamente à disposição, signifique aumento de produtividade ou que o trabalhador se limite a isso, uma peça estática na engrenagem. A produtividade deve passar por métricas mais apuradas e é preciso ter uma ótica diferente em relação àquele que agrega à estrutura empresarial”, finaliza.