A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece o fim da escala trabalhista 6×1 (trabalha seis, folga um), de autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL), alcançou 194 assinaturas de apoio à discussão no Congresso Nacional nesta quarta-feira, 13 de novembro – para ser votada, a PEC precisa de pelo menos um terço dos deputados (171 assinaturas) ou um terço dos senadores (27 assinaturas). A proposta defende que o trabalhador tenha ao menos dois dias de descanso na semana e uma redução na carga horária para 36 horas, que pode chegar à escala 4×3 (trabalha quatro, folga três).
Em 1932, por decreto de Getúlio Vargas, foi criada a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) que definia limitação de oito horas diárias e 48 horas semanais de trabalho. A Constituição de 1988 alterou esse quadro, reduzindo a jornada de 48 horas semanais para 44 horas. Geralmente as pessoas trabalham 8 horas por dia, entre segunda-feira e sexta-feira, com 2 horas de intervalo de almoço, iniciando às 8h e terminando às 18h, no chamado horário comercial, e 4 horas por dia aos sábados, completando 44 horas semanais.
A regra geral é de que nem todas as atividades empresariais podem ser exercidas todos os dias, especialmente nos finais de semana, com ênfase no domingo, assim como em feriados. Mas existem atividades que possuem autorização para funcionamento aos finais de semana e feriados, de forma que há trabalho prestado nos 7 dias da semana, como por exemplo call centers, farmácias e os shopping centers.
“É um sinal que a população tem interesse em rediscutir as relações de trabalho”
Há casos em que a jornada é distribuída ao longo de 6 dias, sendo obrigatória a concessão de 1 dia de folga na semana e o trabalhador possui jornada inferior a 8 horas diárias. Isso faz com que a pessoa trabalhe 7 horas e 20 minutos por dia.
Quem defende o fim da escala 6×1, argumenta que a vida do empregado para além do trabalho é limitada, tendo à disposição somente um dia de descanso. Esse descanso é concedido ao menos uma vez em coincidência com o domingo. Essa pessoa, então, tem um domingo de folga no mês e trabalha 6 dias por semana.
“É uma realidade conflitante com a regra geral dos empregados, tirando do trabalhador as plenas condições de compatibilidade de convívio social com os demais. Essa é a grande discussão por trás da jornada 6 x 1, permitir que a pessoa tenha condições mais amplas de convivência social”, explica o advogado trabalhista Matheus Scoponi.
O projeto proposto visa alterar o art. 7°., XIII, da Constituição Federal. Hoje, o inciso XIII tem como redação que “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho”. A alteração traz como novo texto: “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e trinta e seis semanais, com jornada de trabalho de 4 dias por semana, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho”.
“Não se sabe exatamente o impacto vindo dessa mudança. É salutar discutir a jornada 6 x 1 e eventuais limitações a ela em prol da saúde do trabalhador, mas o texto proposto vai muito além disso e, até o presente momento, não há experiências vastas de jornada de 4 dias semanais para avaliação dos impactos, até mesmo negativos ao trabalhador”, avalia Scoponi.
Para o economista Luiz Ongaratto, essa discussão “é um sinal que a população tem interesse em rediscutir as relações de trabalho. O que que a gente vê aí como prós, especialmente para o trabalhador, é que ele vai ter mais tempo para descanso, lazer, tempo com a família, que busca mais qualidade de vida. Então tem toda essa questão também social muito importante”.
Uma das preocupações presentes é do impacto econômico para pequenas empresas e pequenos empresários, que poderiam não arcar com esse tipo de mudança. O economista Luiz Ongaratto avalia que ainda é muito cedo para ter uma projeção clara sobre isso: “Muito provavelmente o setor mais prejudicado será o de shoppings centers, que talvez tenha que fazer uma readequação necessária”.
Por meio de notas, a Câmara de Dirigentes Lojistas de Goiânia (CDL) e a Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Goiás (FCDL-GO) se manifestaram sobre o tema. A CDL manifestou preocupação e diz no texto que a redução da carga horária isoladamente “não é suficiente para melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores. Para a entidade, o bem-estar dos funcionários é influenciado por uma série de fatores que passam por políticas públicas e incluem o acesso a um transporte público eficiente, uma educação de qualidade e um sistema de saúde adequado”.
“A CDL Goiânia entende que a implementação de uma jornada reduzida trará inevitavelmente um aumento de custos operacionais para as empresas, refletindo-se, em última instância, no preço das mercadorias e serviços oferecidos. Esse aumento de custos pode afetar diretamente os próprios trabalhadores e consumidores, reduzindo o poder de compra da população”, argumenta. “A CDL Goiânia acredita que o tema merece um debate técnico e aprofundado que leve em conta alternativas mais abrangentes e eficazes para a melhoria da qualidade de vida e das condições de trabalho”, completa o texto.
O sentimento da FCDL é de preocupação, mas a entidade se reserva o direito de um debate mais profundo quando o projeto chegar ao plenário.
“A FCDL-GO acompanha com preocupação o avanço do assunto. A Federação se mobilizará com a CNDL em defesa do setor, em conjunto com a FCS (Frente Parlamentar do Comércio e Serviços), para evitar possíveis prejuízos ao movimento lojista. É certo que a contratação de mão de obra no comércio é assunto de extrema importância e atenção, cabendo o debate técnico durante a tramitação das matérias legislativas no devido âmbito de competência: o Congresso Nacional”, diz o texto.
“A proposta de alteração da jornada 6×1 para 4×3 é uma proposta descabida para a realidade do Brasil. Nós precisamos aumentar a produtividade, com certeza. Trabalhando dias a menos e horas a menos, a produtividade já cai, não tem jeito”, disse o presidente da Fecomércio-GO. “E é por falta de capacitação, é por falta de leis trabalhistas mais flexíveis para que ele pudesse, para que ele possa desenvolver melhor o trabalho dele. Restringindo ainda mais, com certeza essa produtividade vai cair ainda mais”, completa. Segundo ele, a proposta é um sonho, “só que a ideia não cabe no momento na realidade do nosso país”.
A PEC ainda não tem previsão de data para ser debatida no Congresso Nacional.